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PENSEI NO SEU SORRISO
Autora: Laurete Godoy *
Hoje,
pensei no seu sorriso. Sorriso branco a ocupar, no rosto criança, todo
espaço a que tinha direito. Espaço que era todo seu, mas também
era nosso. De todos os paulistas, de cada brasileiro.
Na infância difícil, seu esperar ansioso para viver a grande paixão.
O corpo franzino, os braços longos, as pernas espertas. A mão
nervosa, esperando o momento certo para bater no bumbo. Você integrava
o Bloco Carnavalesco Charles, Anjo 45. O bumbo bumbava, você gingava.
As pernas espertas. No rosto, um sorriso alegre como a esperança. Paulo,
seu pai, orgulhoso. Chicão, seu irmão, ensaiava os mesmos passos
na calçada. Você era rei e artista. Seus pés ligeiros desenhavam
filigranas no chão. Carnaval! Pindamonhangaba! Você criança.
Chegou a adolescência. Segurou você pela mão e levou-o por outros caminhos. No esporte, a mais nova paixão. Primeiro, o ginásio fechado. As pernas já longas e fortes. Porém, sempre espertas. Pés ligeiros, não aceitavam mais os limites das quadras. Precisavam de espaço. Ilimitado. Assim você chegou às pistas de Atletismo. A partir daí o espaço era todo seu. A céu aberto. É difícil reproduzir a trajetória de um astro. Pelo menos, para quem nada entende de Astronomia. Para quem apenas sabe que "Astro é um corpo celeste, luminoso por si mesmo". Você, os olhos grandes, vivos, do tamanho do sol. Sempre o mesmo sorriso alegre a iluminar sua brilhante trajetória. Foi ela que o levou a terras distantes. Integrante da Seleção Brasileira de Atletismo.
Cidade
do México, 15 de outubro de 1975.
A camiseta amarela, o nome do Brasil em cima do coração. Os pés
nervosos, esperando o momento certo para baterem na tábua de impulsão.
As evoluções foram substituídas pela corrida veloz,em linha
reta. Esquerdo, esquerdo, direito. Os mesmos pés ligeiros,as mesmas pernas
espertas. Inacreditável! O melhor do mundo! Recordista do Século
XXI. O bumbo, dentro do peito a bumbar descompassado. Filigranas na alma. Você,
ajoelhado, chorando. Em meio às suas lágrimas, o sorriso dos seus
patrícios. As mãos dos brasileiros encontraram-se eufóricas,
vigorosas, para o aplauso. O Brasil, de pé, em uma grande ovação.
Para os estrangeiros, o "Oliveira", do Brasil.
Para os brasileiros, o "João do Pulo", nosso.
Jogos Pan-Americanos de 1975. Você, pouco mais que adolescente.
São
Paulo, 9 de setembro de 1982.
Hoje, em meio às minhas lágrimas, não vi o seu sorriso.
Sorriso branco igual a quarto de hospital. O corpo franzino, o corpo magro,
as pernas fracas. Os pés parados. No rosto, um olhar pequeno e triste
como a derrota. O bumbo, dentro do peito, batendo baixinho, calado, quase mudo.
Mesa de operações - Você, homem.
Por certo você chorou. No meio das suas lágrimas, o chorar dos seus patrícios. Aquelas mesmas mãos, que se encontraram eufóricas e vigorosas para os aplausos, entrelaçaram-se silenciosas para a prece. Todo o Brasil, de joelhos,em uma grande oração.
Para os estrangeiros, o "Oliveira", semideus.
Para os brasileiros, o "João do Pulo", nosso. De todos os paulistas, de cada brasileiro.
* Pesquisadora, escritora e Esportista laureada
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